Diário do Congresso Nacional

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28/6/51

29/6/51

Movimento separatista do Triângulo Mineiro

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O SR. PRESIDENTE — Tem a palavra o Sr. Mário Palmério, inscrito na segunda parte do expediente.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Sr. Presidente, a imprensa do país, notadamente a da capital de São Paulo e de Belo Horizonte, tem noticiado, com destaque invulgar, um acontecimento que vem tendo lugar numa das regiões de Minas Gerais, conhecida como o Triângulo Mineiro.

O Triângulo Mineiro é aquela região limitada pelos rios Grande e Paraíba, lindeira dos Estados de Goiás, Mato Grosso e São Paulo. Mede cêrca de 92.000 quilômetros quadrados e conta com uma população de cêrca de 900.000 habitantes, distribuídos pelos seus 38 municípios.

Êsse movimento é conhecido imprópriamente como "movimento separatista do Triângulo Mineiro".

Na sua edição de sábado passado, o "Correio da Manhã", tradicional órgão da nossa imprensa publicou um tópico sôbre a questão e que, com permissão da Câmara, vou ler:

SEPARATISMO?

"Liberdade!" "Tudo pelo país!" "Nenhuma submissão aos déspotas lá na capital!" "Independência!" — que linguagem é está? É a linguagem dos revolucionários americanos que, no comêço do século XIX, se insurgiram contra o domínio dos espanhóis e portuguêses na América do Sul. É, hoje em dia, uma linguagem histórica, peça de museu. Mas acaba de ser revivificada, em 1951, no país infelizmente escravizado em que se adora a zebu: no Triângulo Mineiro.

Chegam de lá, com efeito, gritos e berros de "Independência ou Morte" como se a criação de bovinos fôsse incompatível com a humilhante submissão aos "déspotas" de Belo Horizonte. Daí se sentem ofendidos os valentes "triangulinos": está içada a bandeira do separatismo.

Êsse movimento, que encontra surpreendente eco jornalístico na capital do país, não é apenas ridículo. Além de ser capaz de incentivar movimentos semelhantes em outros pontos do país, semeando novas inquietações de que não sentíamos falta, o separatismo "triangulino" é perigoso do ponto de vista econômico: o Estado de Minas Gerais ficaria mutilado, talvez mortalmente ferido; por outro lado, o novo Estado da Federação seria apenas um apêndice de certo setor da economia paulista, entregue ao bel-prazer; de quem deseja manobrá-lo para fins que não têm nada com a agropecuária em geral e a criação do zebu em particular. Quem seriam esses "estrangeiros"?

Chegam os separatistas a alegar pedigree histórico do seu movimento: na época do Segundo Reinado, um certo dr. Genettes já teria apregoado a independência do Triângulo. Foi um médico francês que acabou maluco. O neo-separatismo triangulino não está sendo fomentado por gente que rasga dinheiro, mas por gente que o emite. Parece tratar-se de uma ação de chantagem contra Minas Gerais que lhe perturba os planos monopolísticos.

Os apóstolos que pretendem erigir, em vez do zebu, um bezerro de ouro, também são "estrangeiros". Mas não são malucos".

Êste, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o tópico publicado com destaque no "Corerio (sic) da Manhã".

Devo declarar que sou triangulino nascido numa das cidades do Triângulo Mineiro, ali vivo, ali exerço minha modesta profissão de mestre-escola, ali fiz tôda a minha campanha eleitoral e estou inteiramente de acôrdo com o movimento que se alastra hoje pelo Triângulo, visando sua emancipação territorial.

Devo declarar ainda, que o tópico do "Correio da Manhã" é absolutamente injusto. O movimento de emancipação do Triângulo Mineiro tem raízes históricas, não podendo ser taxado de ridículo, como o foi.

Fiz uma campanha eleitoral de 13 meses, conheço posso dizer à Casa, palmo a palmo aquela região. Visitei, por diversas vêzes, tôdas as suas cidades, fui a todos os seus lugarejos e pude conviver de perto com seus habitantes.

O movimento de emancipação do Triângulo Mineiro é um movimento sério, que já está tendo repercussão nacional, e não é justo, e não posso lêr, sem protesto, os comentários da imprensa que visam tachá-lo de ridículo e estreitamente anti-Minas Gerais principalmente quando se dá a entender que êsse movimento é manobrado por certo setor da economia paulista.

Não é real. A política paulista nunca influiu na política do Triângulo Mineiro. Agora mesmo, nas últimas eleições, verificamos que o Partido Social Progressista, que é um partido de paulistas, foi inteiramente derrotado nas nossas cidades, não conseguindo fazer nenhum cargo eletivo de expressão.

O Sr. Galeno Paranhos — Parece-me que há um êrro do "Correio da Manhã", quando diz que o Dr. Genettes, foi o primeiro a pugnar pela emancipação do Triângulo Mineiro. O Dr. Genettes desejava era a anexação do Triângulo Mineiro a São Paulo. Esta a verdade histórica.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Obrigado a V.E.xª.

Outra expressão do comentarista do "Correio da Manhã" é aquela que fala "no país em que se adora o zebu".

O Sr. Paulo Lauro — Se o Partido Social Progressista pudesse influir decisivamente na zona de V. Ex.ª, ajudaria com tôdas as fôrças a eleição de V.Ex.ª.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Agradeço a V.Exª, apesar de não ter entendido bem o aparte do nobre Deputado.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, não há, no movimento de emancipação do Triângulo Mineiro, intenção alguma de menosprezar governos ocasionais de nosso Estado. Há mais de 60 ou 70 anos existe tal movimento, aliás perfeitamente legal, pois está amparado em dispositivos constitucionais que permitem aos Estados se desmembrarem, se anexarem e criarem novos territórios. Está, por outro lado — e isto é o mais importante — apoiado inteiramente pelo Conselho Nacional de Geografia e Estatística, pelo I.B.G.E., que já fez publicar, em 1938, trabalho interessantíssimo, muito bem estudado, sôbre a redivisão política e administrativa do país. Defendo o movimento de emancipação do Triângulo Mineiro por ser movimento nacional, e procuro enquadrá-lo no plano do I.B.G.E., de redivisão territorial brasileira. Estou absolutamente ocerente (sic) com aqueles que, no Triângulo Mineiro, me elegeram. Aqui estou para debater, perante a Câmara, êste movimento da minha região; aqui estou para fazer sua propaganda e lutar pela sua vitória.

Sr. Presidente, há, naquela região, diversas coincidências interessantes. Lá, cria-se o zebú (sic), o tão acusado zebú (sic), mas que todos sabemos ser a salvação da pecuária nacional. Peço para isto o testemunho dos criadores do Norte do país, dos criadores de Goiás, de Mato Grosso e dos de tôdas as zonas territoriais brasileiras de clima inóspito, tropical as quais, sem o zebú (sic) não teriam pecuária. Há a coincidência de possuir larga faixa de terras de cultura que podem ser consideradas como as das melhores do mundo...

Há o seu potencial hidro-elétrico poderosíssimo.. Há sua (sic) cidades altamente progresistas (sic)...

O SR. PRESIDENTE — Atenção! Lembro ao nobre orador estar findo o prazo de que dispunha.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Agradeço a V.Ex.ª

O Sr. Rondon Pacheco — Filho do Triângulo Mineiro e representante daquela região, nesta Casa, empresto valor histórico à declaração de V.Ex.ª. Desejo também situar-me historicamente neste episódio. Candidato mais votado no Triângulo Mineiro, e procurando traduzir os sentimentos do meu povo, como triangulino, declaro que me sinto ligado a Minas, como Minas ao Brasil. O que existe em nossa região — permito-me divergir de V. Ex.ª. — é um estado de insatisfação quanto aos poderes públicos de Minas Gerais, em particular, que não tem atendido o Triângulo na medida do seu merecimento, mas considerando os nossos vínculos ao patrimônio histórico de Minas o problema dentro do seu ponto estritamente cívico, eu proclamo, neste momento, e levanto uma bandeira — o da maior integração a Minas Gerais, por Minas e pelo Brasil, convicto de que seremos compreendidos nas nossas justas reivindicações. (Palmas; palmas, muito bem).

O SR. MÁRIO PALMÉRIO - Terminando, devo declarar que a posição do nobre Deputado Rondon Pacheco, nesta questão, é justificável também. Êle se coloca pela permanência do Triângulo como região mineira; eu me coloco como defensor da criação de um novo Estado no país, Estado êsse previsto e defendido pelo Conselho Nacional de Geografia e Estatística e que é o movimento defendido por uma verdadeira elite de patriótas (sic) e pela grande maioria dos meus coestadoanos do Triângulo Mineiro.

O Sr. Fernando Ferrari — Poderia V. Ex.ª dizer, já que estou curioso, qual o nome do novo Estado?

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Paranaíba, segundo lembra o plano Segadas Viana —Teixeira de Freitas.

O Sr. Guilherme de Oliveira — Noto que o V.Ex.ª neste assunto está em contradição com o Prefeito de Uberaba, eleito pela mesma legenda que trouxe V.Ex.ª a esta Casa. O Sr. Antônio Próspero já fez declarações a Imprensa no sentido de que é contra o movimento separatista, ou pelo menos está inteiramente alheio a êle.

O SR. MÁRIO PALMÉRIO — Nobre Deputado: no nosso Partido, somos assim. Se não pensamos da mesma maneira, se divergimos, discutimos democráticamente (sic) e aceitamos a tese da maioria de pronunciamento. O assunto vai entrar em debate. Pleiteia-se mesmo um plebiscito no Triângulo Mineiro. Eu me coloco na posição de defensor do Triângulo Mineiro. Meu dileto amigo e chefe do meu partido em Uberaba Sr. Dr. Antônio Próspero um dos trabalhistas de maior prestígio daquela região, coloca segundo a afirmação que ouço de V.Ex.ª contra essa tese. Ou é a ela indiferente... Isso, entretanto, não impede que debatamos democráticamente (sic) o assunto dentro de um clima de compreensão, de camaradagem, de companheirismo, sem perturbar absolutamente, a unidade partidária.

Sr. Presidente, termino as minhas palavras fazendo novamente a minha profissão de fé em favor do movimento pró emancipação do Triângulo Mineiro e pela criação de novo Estado na Federação brasileira. Sou pela solução nacional, despida de regionalismo estreito e impatriótico. Sou, acima de tudo, brasileiro e progresista (sic). Viso o progresso da região em que nasci e onde trabalho modestamente em benefício de seu desenvolvimento material e, sobretudo, cultural. Se os técnicos especializados do I.B.G.E. defendem a tese da nova divisão política do Brasil, é porque a reputam patriótica e fundamental para o progresso da nação. Estou com êles e com meus irmãos triangulinos. Emancipemos o Triângulo Mineiro, visando, acima de tudo, o bem do Brasil! Acredito que a tese que esposamos merecerá a atenção preciosa do Congresso Nacional e, sobretudo um debate esclarecedor, à luz das nossas necessidades de progresso e bem estar nacional. Aqui estarei, coerente comigo mesmo e com meus companheiros do Triângulo Mineiro, e defenderei, nesta Casa, as suas mais sentidas reivindicações, pois êste é — sinto-o sinceramente — o meu mais sagrado dever. (Muito bem; muito bem. Palmas).

Durante o discurso do Sr. Mário Palmério, o Sr. Adroaldo Costa, 2º Vice-Presidente, deixa a cadeira da presidência, que é ocupada pelo Sr. Nereu Ramos, Presidente.

 

DIÁRIO do Congresso Nacional. Sessão: 28/6/51. Publicação: 29/6/51. Assunto: Movimento separatista do Triângulo Mineiro. p. 4567. Coluna: 4.